Contrariedades que se revelam oportunidades
O Pai da Matilde
Em abril de 2013 soube que em agosto desse ano seria mais uma vítima da crise e que seria mais um a engrossar as fileiras dos desempregados. Tinhas perto de 6 meses e encontrava-me a gozar a licença de paternidade quando recebi o telefonema.
A primeira reação é de choque! E agora?! Depois de 13 anos numa empresa, esta não era propriamente a notícia que gostaria de receber, ainda para mais a 6 meses de distância de teres nascido. Apesar de tudo não entrámos em pânico porque sempre fizemos questão de nos precavermos para uma eventualidade e a tua mãe mantinha-se sólida no seu emprego.
Passámos a ser uma família pouco convencional nesse aspeto: mãe a trabalhar e pai em casa a tempo inteiro a cuidar de ti.
Quando fizeste 10 meses, e a mamã começou a trabalhar, ainda te inscrevemos numa creche, mas após mês e meio de “infectário”, concordámos que ficarias comigo em casa.
Inicialmente houve algum receio que isso pudesse ser prejudicial em termos de socialização com outras crianças, mas o pediatra descansou-nos afirmando que até aos 3 anos não há grandes benefícios em termos sociológicos para as crianças e que seria até prejudicial, noutros aspetos, pela quantidade de vírus e outros seres microscópicos que habitam creches e infantários. Havendo essa possibilidade, seria sempre melhor ficares em casa até aos 3 anos. Tens a sorte de teres muitos primos e a convivência com crianças nunca te faltou.
Estive mais de dois anos contigo em casa a conhecer-te e a usufruir de momentos inesquecíveis de partilha e de amor.
Estabelecemos rotinas de que ainda hoje sinto uma enorme falta: acordar contigo de manhã com mimos, muitos mimos, dar-te o leitinho, brincarmos os dois, as idas diárias ao parque para te ver feliz, até da sesta que muitas vezes demoravas mais de uma hora a adormecer, e eu contigo ao colo a cantar-te canções de embalar, e canções de outros géneros que eu cantava para ti, por falta de repertório em canções infantis... canções que eu gostava e que tu gostavas também.
Foi uma decisão difícil mas foi a decisão acertada, tinha o melhor emprego do mundo e aquele que mais gostava de desempenhar: ser teu pai!
Muitas vezes a vida traz-nos o que pensamos serem contrariedades mas que não são mais do que oportunidades, e a oportunidade que tive de passar esse tempo contigo não a trocaria por dinheiro nenhum nem emprego nenhum no mundo.